Não é segredo que os vinhos argentinos – até mais do que os chilenos– são muito amados no Brasil.
Muito mais amados do que a própria produção nacional. São objetos de desejo e de descaminho. E são acolhidos com tamanha devoção que não importa se alguns deles inundam a boca com madeira ou se ficam devendo na elegância e no frescor: eles são e vão continuar sendo sinônimo de coisa boa pra muitos enófilos brasileiros.
Mas, cá entre nós… tem vezes que seria melhor pedir uma cerveja ou uma caipirinha do que bebê-los. Digo isso aqui, na segurança desse blog! Jamais diria isso olhando dentro dos olhos de um Catena ou Vigil lover, ainda mais se ele estiver na praia, pedindo uma sequência de ostras pra acompanhar a sua garrafona de Malbec.
Gosto se discute, mas só quando vale a pena. E geralmente não vale.
Sem perder o tema principal de vista, o Almanegra é um desses rótulos argentinos pop que está nas mesas e nas hashtags gerando sempre muita curiosidade.
Créditos: site oficial Ernesto Catena Vineyards
Quem assina o Almanegra Tinto 2017 é Ernesto Catena, filho do consagrado Nicolás Catena Zapata, um dos maiores nomes da viticultura argentina.
No seu site oficial, Ernesto diz apostar na agricultura biodinâmica e lança algumas frases sobre sua conexão com a natureza e com o universo, numa jornada que envolveria elementos tradicionais e modernos. Diz ser um poeta do vinho, cuja missão é transformar a vinificação em arte.
Responde por 5 vinícolas: a Bodega Siesta, Ánimal Organic, Finca de los Padrillos, Winery & Vineyards Tikal Natural e Domaine Almanegra, cujo conceito é, na verdade, uma proposta: fechar os olhos e se perder nos aromas e sabores das uvas. O vinho de hoje veio de lá e quem o traz é a Mistral.
Porém, a Mistral foi bastante econômica na descrição do vinho (talvez ele se venda tão bem que dispensa apresentações). No caso, descreve apenas que “é um delicioso “corte secreto” de Tikal, que não revela quais uvas ou qual a proporção que entra neste intrigante blend. O bouquet é exuberante e exótico, enquanto no palato o vinho se mostra macio e intenso, com personalidade bastante peculiar”.
O produtor só apresenta no site a ficha técnica da safra 2016, que é mais poética do que descritiva: “uma porta aberta para os bosques de frutas vermelhas. Uma passagem mágica sobre colchões de cerejas, amoras e troncos defumados que flutuam no ar. Um vinho com corpo e alma, de cor intensa e companhia elétrica. Na boca, maravilhosas nuances de madeira e final herbáceo e memorável. Uma fotografia inquietante e indestrutível de tudo o que vai bem num vinho”. (tradução livre).
Poesias à parte, é um vinho bem fácil de descrever. Não quero me alongar, mas são intensos os aromas de violeta (mais murcha) e de ameixa, groselha e cerejas pretas, além de serem perceptíveis a menta, a pimenta do reino, o fumo e o carvalho. Ele é seco, com acidez alta e taninos finos e bastante suaves. Tem corpo médio e exibe uma grande concentração de fruta e de madeira que ficam na boca desde os primeiros goles.
Harmonizado com um carré de javali, o vinho não se saiu mal com a parte menos gordurosa da carne. Porém, onde sobrava gordura, sobrava também a riqueza e o pronunciado sabor do javali, que demandava mais potência e estrutura do vinho – características que não são a proposta do Almanegra Tinto.
Paguei R$ 188,99 por ele lá em 2020. Dois anos depois, o vinho está por R$ 245,97.
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