Um consumidor estará sempre sujeito a comprar produtos (em lojas físicas ou virtuais) que possam vir com algum defeito ou avaria. E, infelizmente, nem os vinhos escapam: é possível abrir uma garrafa de vinho e ter o azar (ou sorte) de identificar um problema na bebida que a torne imprópria.
No mundo dos vinhos, a identificação de defeitos pode não ser uma tarefa das mais fáceis e não é raro encontrar alguém “colocando defeito” onde não há ou provando vinhos com defeito sem perceber.
No caso, alguns problemas dependem da sensibilidade e da experiência do apreciador de vinhos, enquanto outros defeitos podem sim ser facilmente identificáveis, não importa a experiência do apreciador de vinhos sobre o assunto.
Sim e, para isso, basta prestar atenção no vinho como um todo. Ou seja: se a garrafa do vinho está íntegra, se o rótulo está adequado (ou seja, sem sujeira, sem mofo ou sem avarias que saltem aos olhos) e se a vedação está correta. Quando aberta a garrafa, resta analisar bem o vinho antes de ingeri-lo: a cor, o cheiro e o sabor da bebida, antes mesmo de serem indicadores de qualidade, servem para atestar a integridade do produto.
Dependendo de qual é o defeito e o estágio em que ele se encontra, pode ser difícil identificá-lo. No entanto, os problemas mais comuns são:
Bouchonnè ou doença da rolha: ocorre quando um vinho é contaminado pelo composto TCA (tricloroanisol), uma substância que surge em decorrência de fungos que atacam a rolha de cortiça. Seja por questões de má-esterilização ou manipulação incorreta da rolha, é um defeito que, infelizmente, não é possível detectar visualmente, apenas pelo olfato e pelo paladar: a rolha e o vinho possuirão um cheiro forte de mofo/papel úmido e o sabor do vinho será intragável.
Oxidação: basta entrar em contato com o ar para um vinho oxidar. Se o tempo de exposição for grande, o vinho poderá se tornar impróprio para o consumo. É um defeito fácil de detectar, pois, além de alterar a coloração da bebida (os brancos costumam ficar com uma tonalidade acobreada e os tintos mais amarronzados), os aromas e o sabor se assemelharão cada vez mais ao vinagre. Um vinho pode oxidar: a) em decorrência de um má-vedação; b) por causa do um armazenamento incorreto (se a garrafa de vinho é deixada por muito tempo na posição vertical, a rolha tende a ressecar e rachar, expondo o vinho ao ar; c) caso o tempo de guarda seja extrapolado; e d) caso a garrafa de vinho seja acondicionada sob temperaturas muito elevadas. Uma situação bem comum e que pode levar a esse defeito, é abrir uma garrafa de vinho, não bebê-la por completo e armazená-la na geladeira por bastante tempo: mesmo refrigerado e vedado, uma vez em contato com o ar, o vinho vai iniciar o processo de oxidação rapidamente.
O odor e o sabor avinagrados no vinho podem acontecer também pela ação de uma bactéria chamada acetobacter, que, na presença de ar, converte o álcool em ácido acético. Evita-se o crescimento dessa bactéria por meio de um correto armazenamento do vinho e mediante o emprego do anidrido sulfuroso (SO2), largamente empregado pelos produtores nacionais e internacionais.
Excesso de SO2: O chamado anidrido sulfuroso ou dióxido de enxofre é um conhecido conservador do vinho: com propriedades antissépticas e antibacterianas, ele o protege da oxidação e da contaminação por microorganismos. Ele é de fácil manipulação e de preço acessível, um binômio bem atraente e que faz muitos produtores empregarem-no em seus produtos para diminuir as chances de contaminação. Ocorre que, em excesso, o SO2 pode alterar o sabor e os aromas do vinho, além de causar dor de cabeça ou despertar alergias em pessoas com maior sensibilidade. Os problemas que ele causa, sobretudo em altas dosagens, podem ser sentidas com o tempo, e a sua toxidade pode até ser fatal.
Normalmente, é possível conferir no rótulo de um vinho o termo genérico “contém sulfitos”, “conservantes: anidrido sulfuroso”, “contém INS220” ou “contém INS202”. Embora não haja obrigatoriedade para a especificação da quantidade utilizada, é importante que se saiba que, no Brasil, admite-se um patamar máximo de utilização do SO2 – 350 mg/l. Vale destacar que, segundo a Resolução RDC n. 12/2008 da ANVISA, o uso de conservadores (incluindo o SO2) deve ser restrita, tendo como Ingestão Diária Aceitável o valor de 0,7mg/Kg por peso corpóreo.
Mofo: Quando o armazenamento de uma garrafa de vinho ocorre em ambientes úmidos, o tempo de exposição pode provocar mofo na rolha. Obviamente que se a rolha, o único vedante de um vinho, não for tratada corretamente, poderá sofrer infiltrações e expor a bebida ao mofo ou à oxidação, deteriorando-a.
Odores de suor, de estábulo, de pau de galinheiro, de bacon, entre outros: é um problema que ocorre na fase de fermentação do vinho, quando o mosto fermentado é atacado por uma levedura chamada Brettanomyces Dekkera que produz a substância tetrahidropiridina. Em níveis baixos, ela atribui complexidade ao vinho; em excesso, torna-o intragável. Geralmente associa-se o ataque dessa levedura à baixa acidez do vinho e ao uso insuficiente de conservadores (como o SO2).
Alguns defeitos, inclusive considerando os anteriormente citados, a depender de seu estágio ou concentração no vinho, podem ou não ser sentidos com facilidade. E há outros que estão relacionados à técnica de vinificação (acidez ou tanicidade elevada ou muito baixa, depósito de material na bebida, sabor muito forte ou leve demais…), que, por vezes, passam mais como características do que como defeitos no vinho. A discussão, quanto a estes últimos, é grande, mas o fato é que comprar um vinho, assim como comprar qualquer produto para consumo, demanda cuidado e paciência para surpresas boas ou ruins.
Assim como ocorre com qualquer outro produto, sobretudo alimentício, a devolução do exemplar defeituoso/avariado/contaminado deve ser feita imediatamente. Muitas lojas especializadas, sobretudo as virtuais, realizam a substituição do vinho por outro igual ou de valor semelhante e até a devolução do dinheiro, a depender de cada caso e da vontade do consumidor prejudicado.